segunda-feira, 6 de novembro de 2017

A Quebra

A quebra.
Do cromossomo ou do sonho?

Receber o diagnóstico de uma alteração genética rara é assustador.
O médico não sabe o que te falar, mesmo por que ele realmente não sabe.
A falta de informação leva ao desespero.
Os médicos não conhecem a condição genética apresentada, não sabem o que ela acarreta, muitas vezes nunca ouviram falar.
E aí, como lidar? Como apresentar? O que esperar?
A medicina exige que eles ajam de forma pragmática, sejam diretos, claros e por que não, frios.
Sim, melhor apresentar o pior cenário, para que não sejamos pegos de surpresa.
E é aí que os sonhos são quebrados juntamente com os cromossomos.
É aí que os médicos se esforçam para que você não tenha esperanças.
Mas é possível que mães e pais não tenham esperança? Eu acho que não.
Eu já vi casos muito muito muito graves, e pais muito muito  muito esperançosos.
Já ouviu aquele ditado que diz: “Quando eu sou bom, eu sou muito bom, mas quando sou ruim, sou melhor ainda?”
Acho que foi criado para médicos que passam diagnósticos para pais de Recém nascidos com condições desconhecidas.
Eles são muito bons, muito mesmo. Chegam a ser cruéis.

E a nós pais, o que resta? Ter uma esperança tão forte, que derrote o medo.
Ter sonhos tão fortes que não sejam possíveis de serem destruídos.
Ou melhor, não ter sonhos. Não planejar.
Grande parte do desespero que vejo em colegas mães vem da idealização da criança durante a gravidez.
Dos planos feitos para aquele bebê, que não existe.
Do Balé, do casamento, da faculdade, da bicicleta sem rodinhas.
As vezes o sofrimento de perda desses desejos é maior que a dor do diagnóstico.
O amor pelo filho é tão intenso, mas ele vive em conflito com a desilusão desses sonhos criados antes mesmo de conhecer esta nova criança.
Existe um termo usado para a fase do diagnóstico: A luta pela perda do filho idealizado.
Enquanto não “matarmos” o filho idealizado, não é possível ser feliz com o filho real.

Vivamos então o sonho diário, o momento, o segundo.
E daí que o filho da vizinha andou com 10 meses?
E daí que o filho da prima já fala 4 línguas?
E daí que o filho da amiga faz balé, judô, nada e dá piruetas?
Nenhum deles passou por 1 décimo do que o meu passou.

Dói olhar aquela criança no shopping andando e correndo? Dói.
Dói ir na festa de aniversário e não poder soltar a criança no Buffet? Dói.
Dói ver as terceiras pessoas reclamarem de coisas banais que meu filho talvez nunca faça? Dói.
Dói ver as pessoas olharem com dó ou com julgamento? Dói.
Dói, mas passa.
Passa a cada barreira quebrada, a cada luta superada, a cada desfio novo.

Nosso foco é outro, nossa realidade é outra,  nossos sonhos também precisam ser.
Que possamos nos adaptar à vida nova e possamos viver intensamente o sonho de ter um filho especial.
Que seja mágico, encantado e maravilhoso, como nunca seria com aquele sonho que não era nosso.
Que a felicidade esteja no que é possível e não na idealização.
E que sejamos muito felizes apesar de tudo.

(Camila Chain Alonso, Feliz com Cri Du Chat, Novembro, 2017)





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