terça-feira, 21 de novembro de 2017

A Cura

Não há cura para o que não é doença.
Uma alteração cromossômica não é uma doença.
Ok, tem CID, mas não tem remédio.

Ele não vai curar!
Graças a Deus, saúde por aqui temos de sobra.
O que ele tem são limitações, como qualquer um tem.
O que ele tem são características que o tornam único, mesmo no seu meio de iguais.
Ele é só mais uma criança, só mais uma pessoa, diferente e individual.

Ele vai ser sempre assim!
Magrelo, miúdo, atrapalhado, desafinado, desajeitado, engraçado e carinhoso.
Mesmo com muito trabalho e muita evolução, ele sempre vai ter um atraso motor e cognitivo.
E sempre será esse pirralho, pestinha, pentelho e amado que já é hoje.

Uma vez, uma pessoa muito especial em um momento de muita dor  na minha vida, me deu uma lição que nunca será esquecida.
Um fisioterapeuta com asas invisíveis de anjo, que o olhava com amor e o chamava de “meu galego” me disse:
“Não cobre dele mais do que ele consegue te dar.
Ele está fazendo o máximo que ele pode.”

E é isso que eu peço para o mundo.
É isso que eu peço para as famílias e os amigos de crianças especiais.
Não cobre dele mais do que ele pode te dar.
Seja feliz com o que ele tem pra você hoje.
Com cada sorriso, cada gargalhada, cada conquista que para nós é uma festa, mas para muito é pouco, é bobagem.

Ignorar as dificuldades e limitações de uma criança especial é discriminação.
Esperar que a ela seja diferente do que ela realmente é, se torne diferente, atinja objetivos que não cabem a ela, é preconceito.
Esperar a cura e a compará-la com primos, irmão, amigos, achando que ela vai “alcança-los” um dia, é intolerância.
Colocar expectativas irreais e se decepcionar quando não forem atingidas é triste e desumano.

Grande parte da luta de pais de crianças especiais é a aceitação.
Aceita-los como eles são, com suas diferenças, limitações e dificuldades.
Olhar dentro de seus olhos e amar tudo o que eles são e tudo o que eles não serão.
Quando vemos pessoas tão próximas esperando ou pedindo pela cura, vemos que eles realmente nunca foram aceitos.

Eles podem muito e a gente sabe disso.
Mas ele nunca vai ser normal.
Nunca vai aparentar, agir, desenvolver ou se comportar uma criança típica.
Aceitar isso é aceitar o Arthur.


Eu aceito!

Brincadeira de criança

É muito comum ao falarmos sobre a condição dos nosso filhos, nos depararmos com expressões faciais ou até mesmo verbais de dó e piedade.
Muitas vezes a expressão vem acompanhada com um “coitadinho, que dó”.
Mas por que coitadinho?
Quando a pessoa não gagueja, a resposta normalmente é a mesma:
- Por que ele não anda;
- Por que não fala;
- Por que não vai conseguir brincar, se divertir ou ser feliz.

PARA TUDO!
Acho que com tanta modernidade no mundo, as pessoas esqueceram o que é se divertir, o que é brincar e ser feliz mesmo.
Essa molecada sabe de verdade o que é se divertir.
Seja sentado, deitado, em pé, com ou sem apoio, no colo ou na cama, correndo ou engatinhando.
Eles realmente sabem se divertir.

Assim como toda criança, eles não são exigentes.
Não se importam com marca, preço, modelo ou tipo de brinquedo.
Para eles, tudo é motivo pra diversão e pra enormes gargalhadas.

Bolas, brinquedos com luzes e sons baixo, brinquedos fofos, de apertar ou morder, potes, meias ou sapatos.
Tudo é diversão.
Mas bolas ainda são a preferência nacional.
Bolas, bolinhas, bolonas, bolas de sabão, bexigas ou balões.
Não tem um que não seja apaixonado pelas redondas.

Crianças especiais não são tristes, deprimidas, carentes e infelizes.
Pelo contrário, são somente crianças, que mais que qualquer outra, precisam de brincadeiras e diversão para se desenvolver.
E o melhor é que qualquer alegria diverte esse pessoalzinho.
Quer fazer uma criança feliz?
Quer fazer uma criança especial feliz?
Sente com ela no chão para brincar.
Ria, se divirta e seja muito feliz por um momento, sem se lembrar que existem problemas.

Mas fica uma dica valiosa: Cada um no seu espaço para começar bem a relação.
Sem toques ou abraços até que ele te dê essa liberdade.
E quando ele se sentir confortável com a sua presença, você terá um amigo para sempre.



segunda-feira, 6 de novembro de 2017

Pais humanos-especiais

“Crianças Especiais só vem para pais especiais!”
Quem nunca ouviu ou até falou essa frase?
Ela é linda, utópica, encantadora, não é?
Não, não é!
É uma frase de conforto.
Amigos, colegas, parentes, conhecidos e familiares de pais de crianças com necessidades especiais encontram nessa frase o conforto para não olhar para a dor alheia.
É um tapinha nas costas, tipo “Aguenta aí, afinal, você é especial.”
Considerar que somos especiais e por isso ganhamos o divino direito de ter uma criança especial desmerece todas as nossos batalhas.
Toda a luta, a aceitação, o diagnóstico, os estudos, as buscas por informação, as idas a médicos e terapias, as madrugadas em claro, as decepções e as alegrias.
Tudo isso vira pó!
Nada disso foi conquista nossa, “tudo isso é natural, porque somos especiais.”
Especiais, imaculados, iluminados, encantados.
Temos que ser fortes, porque afinal, o resto da família precisa chorar.
Não podemos ter um dia ruim, não podemos reclamar, chorar, amolecer por um instante, porque somos especiais e ganhamos o direito de tê-los e devemos agradecer 24 horas por dia, 7 dias por semana.
Desculpa contar, mas não é assim.
Somos somente humanos, somente pais como todos os outros, porém vivendo a vida no modo Hard, mega ultra difícil.
Dá vontade de jogar o controle remoto longe as vezes, mas logo a gente corre atrás dele.
O mundo nos vê de forma binária: Ou somos abençoados, angelicais, e de aço, sem direito ao choro e ao luto, satisfeitos e agradecidos o tempo todo, ou somos pobres coitados sofredores, fadados ao luto, sem direito a alegrias, vida social e sorrisos.
Sem meio termo.
Não, não é assim.
Somos humanos.
Somos pais.
Somos de carne e osso.
Cheios de defeitos e fraquezas.
Cheios de amor e força.
A vida exigiu que nos tornássemos especiais, mas também precisamos de colo as vezes, muitas vezes!
(Camila Chain Alonso, Feliz com Cri Du Chat, Dezembro 2017)
Com a ajuda e a inspiração da amiga Andreza.
Uma mãe.


A Quebra

A quebra.
Do cromossomo ou do sonho?

Receber o diagnóstico de uma alteração genética rara é assustador.
O médico não sabe o que te falar, mesmo por que ele realmente não sabe.
A falta de informação leva ao desespero.
Os médicos não conhecem a condição genética apresentada, não sabem o que ela acarreta, muitas vezes nunca ouviram falar.
E aí, como lidar? Como apresentar? O que esperar?
A medicina exige que eles ajam de forma pragmática, sejam diretos, claros e por que não, frios.
Sim, melhor apresentar o pior cenário, para que não sejamos pegos de surpresa.
E é aí que os sonhos são quebrados juntamente com os cromossomos.
É aí que os médicos se esforçam para que você não tenha esperanças.
Mas é possível que mães e pais não tenham esperança? Eu acho que não.
Eu já vi casos muito muito muito graves, e pais muito muito  muito esperançosos.
Já ouviu aquele ditado que diz: “Quando eu sou bom, eu sou muito bom, mas quando sou ruim, sou melhor ainda?”
Acho que foi criado para médicos que passam diagnósticos para pais de Recém nascidos com condições desconhecidas.
Eles são muito bons, muito mesmo. Chegam a ser cruéis.

E a nós pais, o que resta? Ter uma esperança tão forte, que derrote o medo.
Ter sonhos tão fortes que não sejam possíveis de serem destruídos.
Ou melhor, não ter sonhos. Não planejar.
Grande parte do desespero que vejo em colegas mães vem da idealização da criança durante a gravidez.
Dos planos feitos para aquele bebê, que não existe.
Do Balé, do casamento, da faculdade, da bicicleta sem rodinhas.
As vezes o sofrimento de perda desses desejos é maior que a dor do diagnóstico.
O amor pelo filho é tão intenso, mas ele vive em conflito com a desilusão desses sonhos criados antes mesmo de conhecer esta nova criança.
Existe um termo usado para a fase do diagnóstico: A luta pela perda do filho idealizado.
Enquanto não “matarmos” o filho idealizado, não é possível ser feliz com o filho real.

Vivamos então o sonho diário, o momento, o segundo.
E daí que o filho da vizinha andou com 10 meses?
E daí que o filho da prima já fala 4 línguas?
E daí que o filho da amiga faz balé, judô, nada e dá piruetas?
Nenhum deles passou por 1 décimo do que o meu passou.

Dói olhar aquela criança no shopping andando e correndo? Dói.
Dói ir na festa de aniversário e não poder soltar a criança no Buffet? Dói.
Dói ver as terceiras pessoas reclamarem de coisas banais que meu filho talvez nunca faça? Dói.
Dói ver as pessoas olharem com dó ou com julgamento? Dói.
Dói, mas passa.
Passa a cada barreira quebrada, a cada luta superada, a cada desfio novo.

Nosso foco é outro, nossa realidade é outra,  nossos sonhos também precisam ser.
Que possamos nos adaptar à vida nova e possamos viver intensamente o sonho de ter um filho especial.
Que seja mágico, encantado e maravilhoso, como nunca seria com aquele sonho que não era nosso.
Que a felicidade esteja no que é possível e não na idealização.
E que sejamos muito felizes apesar de tudo.

(Camila Chain Alonso, Feliz com Cri Du Chat, Novembro, 2017)





A ilusão da inclusão

Não, a inclusão não existe! Eu posso afirmar.  É uma utopia, mas isso não quer dizer que vamos parar de lutar por ela.  Todo mundo apoia a i...